terça-feira, 29 de dezembro de 2009

O direito ao bom nome


3 - O direito ao bom nome


Segundo o artigo 33.º da CRP referente ao direito à identidade, ao bom nome e à intimidade:

1. A todos é reconhecido o direito à identidade pessoal, ao bom nome e reputação e à reserva da intimidade da vida privada e familiar. 2. A lei estabelecerá garantias efectivas contra a utilização abusiva, ou contrária à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias.



Numa sociedade democrática e num estado de direito o respeito pelo bom nome das pessoas e instituições é um pilar. No entanto, em Portugal, é cada vez mais comum o atropelo a este direito básico, vindo dos mais variados quadrantes, mas sempre com a mais sórdida consequência: qualquer acusado na praça pública passa a ser culpado até prova em contrário. E por muito que se prove a inveracidade da acusação, fica sempre o sulco permanente da suspeita, que muitas vezes acaba por estilhaçar pessoas e instituições. Todo o cidadão tem o direito a ter a sua imagem dissociada dos factos, que lhe sejam imputados sem que existam provas credíveis que fundamentem essa associação ou acusação.


A realidade é que actualmente, muitas vezes o bom nome é atentado através da comunicação social, de forma injusta, criando um conflito entre ambos os direitos: o direito ao bom nome e o direito de expressão/liberdade de imprensa. Quando ocorre este conflito de interesses, que direito deve prevalecer? Perante a impossibilidade de chegar a uma situação harmoniosa para ambos que decisão tomar?


O que não é justo é um cidadão ver o seu bom nome a sua reputação machados em praça pública pela comunicação social antes mesmo de lhe serem ou não imputadas responsabilidades, nos órgãos competentes, e esta culpa manchar de forma muito prejudicial. Os órgãos de comunicação social têm o dever de informar, mas têm e devem ter o dever de respeitar os cidadãos, moderando a forma como os expõem perante a opinião pública. O direito à liberdade de imprensa deve ser respeitado, mas o direito ao bom nome também.



quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

A liberdade de imprensa


2 – A liberdade de imprensa


Um Estado de Direito Democrático implica a existência de uma Comunicação Social livre e pluralista. Para que esta assim exista é necessário que salvaguarde, entre outras, a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa e a liberdade de programação, direitos estes consagrados na Constituição.


A dualidade começa aqui: a liberdade de imprensa constitui um direito: o da abstenção de intervenção estatal no sentido da inexistência de censura, e o dever desse mesmo órgão fornecer informação rigorosa, isenta e pertinente, de forma a garantir o direito individual à informação. Assim, a liberdade de imprensa implica dois direitos: o de informar e o de ser informado. E as duas respectivas garantias: a garantia de não intervenção (estatal ou privada) e a garantia de rigor e isenção.


À semelhança de tantas outras liberdades garantidas, a liberdade de imprensa também não é ilimitada. Isto porque, o respeito por outros direitos pode constituir limites à liberdade de imprensa. Falamos obviamente da questão dos direitos individuais. Assim, a liberdade de imprensa não pode violar nem restringir o direito de cada cidadão ao seu bom-nome, à sua reputação, imagem ou intimidade nem tão pouco à liberdade individual de expressão.



A garantia da liberdade de imprensa é essencial para a manutenção de uma democracia. Países onde os direitos à liberdade de imprensa são postos em causa, são, geralmente países com falsas democracias ou com regimes ditatoriais. Sem liberdade de expressão não há cidadania e sem cidadania não há liberdade.


Sabemos que os regimes totalitários são sempre hostis aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e que, nestes estados, a liberdade de imprensa não existe. Por outro lado, os índices de desenvolvimento humano estão sempre associados ao grau de liberdade e de liberdade de imprensa de cada país. Os países mais desenvolvidos do mundo são os que têm um maior grau de liberdade de imprensa.


Portugal caiu 14 posições no ranking da liberdade de imprensa, o que deveria merecer uma reflexão da parte de todos os agentes públicos, em especial dos governantes e dirigentes da administração pública, políticos, editores e jornalistas. A dependência da publicidade, num mercado em crise, leva a que seja cada vez mais difícil aos órgãos de comunicação social desenvolverem a sua actividade.



Os poderes públicos em Portugal preferem uma imprensa frágil e anulam os apoios e o investimento em publicidade institucional criando uma relação de submissão que subverte os pressupostos de uma comunicação social forte. Se há um ano estávamos em 16º juntamente com a Holanda, Lituânia e República Checa, agora partilhamos o 30º lugar da lista dos mais respeitadores da liberdade de imprensa com a Costa Rica e o Mali. Num ranking liderado pela Dinamarca, do qual Cuba, Irão e Eritreia ocupam os últimos lugares, sendo os menos respeitadores das liberdades de informação.


Esta queda é dúbia, pois, se por um lado há a condicionante económica no que diz respeito à subversão da comunicação social a outros interesses, por outro lado, com a cada vez maior adesão das pessoas aos serviços de informação disponibilizados pela internet, a realidade é diferente uma vez que a blogosfera e a Internet permitiram que um maior número de pessoas pudesse usufruir de um direito de expressão.


A liberdade de expressão tem vindo a aumentar à medida que aumentam os suportes de expressão, portanto, deste ponto de vista, a liberdade de expressão é maior do que nunca, especialmente se comparada com a realidade histórica que Portugal viveu antes do 25 de Abril de 1974, realidade essa em que o direito de expressão era fortemente negado ao conjunto dos seus cidadãos.


Em suma, a liberdade de imprensa é fundamental num Estado democrático e deve ser respeitada, como garantia de liberdade de expressão dos cidadãos, mas não deve, contudo, atentar contra o bom – nome e reputação dos cidadãos sob a desculpa do direito à liberdade de expressão.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

O direito ao bom nome e a liberdade de imprensa




1- O direito ao bom nome e a liberdade de imprensa

O direito à informação é incontornável para o justo funcionamento de uma sociedade democrática. No entanto, se a informação passa pelo assegurar da livre possibilidade de expressão e pelo confronto das diversas correntes de opinião, não se pode esquecer que essa possibilidade não pode contundir com os direitos de personalidade de cada cidadão.


Estamos assim, perante um complicado dilema. Segundo a nossa Constituição, toda a pessoa goza do direito à integridade moral e física, e ao bom-nome e à reputação, dispondo-se a proteger os cidadãos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral. Existem, portanto, direitos fundamentais, consagrados constitucionalmente e, de entre eles, o direito ao bom-nome e reputação.



È inegável que o direito à liberdade de expressão é um pilar essencial do Estado de Direito Democrático em que vivemos, no entanto, esse direito não pode ser exercido com ofensa de outros direitos, designadamente o direito ao bom nome e à reputação. Estamos, portanto, perante dois direitos constituídos e consagrados na nossa legislação, que chocam muitas vezes.


Daqui a necessidade de conciliar o direito de informação com a não violação do direito ao bom nome e à reputação dos cidadãos. Como o fazer então? A dificuldade de estabelecer uma ordem hierárquica entre um direito e o outro é muito grande e o bom – senso nem sempre reina. Mediante as situações e circunstâncias, há que colocar na balança ambos os direitos e verificar qual tem mais peso, caso a caso, e sem generalizações.



Sabemos que temos chegado a extremos indesejáveis. Apregoamos tanto a necessidade de não violar o direito à liberdade de expressão, mas esquecemo-nos que ao fazê-lo, estamos muitas vezes a provocar danos insanáveis no bom – nome das pessoas. Os meios de comunicação eficientes não fazem julgamentos precipitados, apresentam dados e não expõem os cidadãos a juízos que podem ou não ser correctos, deixando estas decisões para as autoridades competentes.


Fontes


quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A Convenção dos Direitos das Crianças II


Estas são algumas das matérias mais importantes da Convenção dos Direitos da Criança:

- Todas as crianças têm o direito à vida e os Estados devem assegurar a sua sobrevivência e desenvolvimento, na máxima medida das suas possibilidades;

- Todas as crianças têm direito a um nome e a uma nacionalidade, desde o nascimento; sendo o seu registo obrigatório imediatamente após o nascimento e sempre que possível, a criança tem o direito a conhecer os seus pais e a ser educada por eles;

- Quando os tribunais, instituições de segurança social ou autoridades administrativas lidarem com crianças, o interesse superior da criança deve consistir numa consideração primordial. A opinião das crianças deve ser atendida;

- Os Estados devem assegurar que as crianças gozem os seus direitos sem serem alvo de qualquer tipo de discriminação ou distinção;

- As crianças não devem ser separadas dos seus pais, salvo se as autoridades competentes decidirem que essa separação é necessária no interesse superior da criança;

- Os Estados devem facilitar a reunificação de famílias, permitindo que as crianças e os seus pais abandonem e regressem ao seu país;

- Os Estados devem proteger as crianças contra danos e negligência física ou mental, incluindo contra os abusos ou a exploração sexual;

- As crianças com deficiências devem ter direito a tratamento, educação e cuidados especiais;

- A educação primária deve ser gratuita e obrigatória e a disciplina escolar deve respeitar a dignidade da criança;

- A criança tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião;

- As penas de morte e de prisão perpétua não devem ser impostas por crimes cometidos antes da idade de 18 anos;

- Nenhuma criança menor de 15 anos deverá participar em hostilidades e as crianças expostas a conflitos armados devem receber uma protecção especial,

- As crianças oriundas de populações minoritárias ou indígenas devem gozar livremente a sua cultura, religião e língua.

- A criança tem o direito de gozar do melhor estado de saúde possível e beneficiar dos serviços médicos. Os Estados partes da Convenção têm também o dever de fazer baixar a mortalidade infantil e assegurar a assistência médica e os cuidados de saúde necessários a estas crianças, combater a doença e a má nutrição e assegurar ás mães os cuidados de saúde antes e depois do nascimento;


Fonte

A Convenção dos Direitos da Criança


4- A Convenção dos Direitos da Criança


A Convenção sobre os Direitos da Criança trata-se do primeiro instrumento de direito internacional a conceder força jurídica internacional aos direitos da criança. A principal diferença entre este texto e a Declaração dos Direitos da Criança, adoptada 30 anos antes, consiste no facto de a Convenção tornar os Estados que nela são Partes juridicamente responsáveis pela realização dos direitos da criança e por todas as acções que tomem em relação às crianças, enquanto que a Declaração de 1959 impunha meras obrigações de carácter moral.


No seu artigo 1.º, a Convenção dos Direitos da Criança define criança como “todo o ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos termos da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo” e consagra quatro grandes princípios:

- Não discriminação (artigo 2.º): Os Estados Partes devem assegurar que as crianças sob a sua jurisdição gozam todos os seus direitos, não devendo nenhuma criança ser vítima de discriminação. Este enunciado aplica-se a todas as crianças “independentemente de qualquer consideração de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra da criança, de seus pais ou representantes legais, ou da sua origem nacional, étnica ou social, fortuna, incapacidade, nascimento ou de qualquer outra situação.”


- Interesse superior da criança (artigo 3.º): O interesse superior da criança deve constituir uma consideração primordial sempre que as autoridades de um Estado tomem decisões que afectem a criança. Este princípio aplica-se às decisões dos tribunais, das autoridades administrativas, dos órgãos legislativos e das instituições públicas ou privadas de solidariedade social.


- Direito à vida, à sobrevivência e ao desenvolvimento (artigo 6.º):
Este artigo consagra o direito à vida, o direito à sobrevivência e ao desenvolvimento, não apenas a nível de saúde física, mas também a nível de desenvolvimento mental, emocional, cognitivo, social e cultural da criança.


- Respeito pelas opiniões da criança (artigo 12.º): Segundo a Convenção, a criança deve ser livre de ter opiniões sobre todas as questões que lhe digam respeito, opinião que deve ser devidamente tomada em consideração “de acordo com a sua idade e maturidade”. A criança tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de procurar, receber e expandir informações e ideias de toda a espécie, sem considerações de fronteiras, sob forma oral ou escrita, impressa ou artística.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

A Convenção sobre os Direitos das Crianças de 1989


3- Evolução da Protecção dos Direitos das Crianças


3. 2 – A Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989


A Convenção de 1989 foi muito semelhante à Declaração dos Direitos da Criança de 1959,contudo nesta nova Declaração, a Comissão dos Direitos do Homem decidiu não só dedicar uma especial atenção à questão da Convenção sobre os Direitos da Criança, mas também submeter o texto proposto a um exame detalhado e a um conjunto de sérias modificações. A nova Convenção foi proclamada em 1989, ano em que se celebrava o 10.º aniversário do Ano Internacional
Da Criança.


A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança foi finalmente adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a 20 de Novembro de 1989 e aberta à assinatura e ratificação ou adesão em Nova Iorque a 26 de Janeiro de 1990. Entrou em vigor a 2 de Setembro de 1990, nos termos do seu artigo 49.º É de notar que a data de adopção da Convenção não foi determinada ao acaso, correspondendo o dia 20 de Novembro de 1989 à data do trigésimo aniversário da Declaração dos Direitos da Criança. Esta data foi decretada pela ONU como Dia Universal da Criança.

Evoluções da Protecção dos Direitos da Criança


3 - Evoluções da Protecção dos direitos da Criança

3.1 - As Declarações de 1924 e 1959


A primeira referência aos direitos da criança num instrumento jurídico internacional surgiu em 1924 quando a Assembleia da Sociedade das Nações adoptou uma resolução endossando a Declaração dos Direitos da Criança promulgada no ano anterior pelo Conselho da União Internacional de Protecção à Infância. Nos termos da Declaração, os membros da Sociedade das Nações eram convidados a guiarem-se pelos princípios deste documento – a Declaração de Genebra.


Esta Declaração reconhecia que a criança devia ser protegida independentemente da sua raça, nacionalidade ou crença ou sexo, devendo ser auxiliada, respeitando-se a integridade da família, possibilitando que todas as crianças sejam colocadas em condições de se desenvolver de maneira normal, material, moral ou espiritual. Segundo esta Declaração, a criança deve ser alimentada, tratada, auxiliada e reeducada. A criança deve ser também a primeira a ser socorrida em situação de emergência. A criança deve também ser protegida contra qualquer forma de exploração.


Em 1946, após a Segunda Guerra Mundial, o Conselho Económico e Social das nações Unidas recomendou que se adoptasse a Declaração de Genebra com o objectivo de canalizar as atenções mundiais do pós – Guerra para os graves problemas com as crianças, tendo criado no mesmo ano o Fundo das Nações Unidas para as Crianças – a UNICEF. Em 1950 a Assembleia Geral das Nações Unidas decidiu que esta instituição devia prosseguir o seu trabalho, por tempo indefinido tendo o seu nome sido alterado Fundo das Nações Unidas para a Infância.


Em 1948 foi adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a Declaração Universal dos Direitos do Homem, mas esta não consagrava a totalidade dos direitos e especificidades das crianças. Assim, em 1959 foi promulgada a Declaração dos Direitos da Criança que afirmava que “ a humanidade deve dar o melhor de si mesma à criança”, constituindo durante muitos anos o maior enquadramento moral para os direitos da criança, apesar de não comportar quaisquer obrigações jurídicas.


De acordo com esta Declaração a criança devia gozar de protecção especial e beneficiar de oportunidades e facilidades para se desenvolver de forma saudável e em condições de liberdade e dignidade. È reconhecido á criança o direito a um nome, uma nacionalidade e á Segurança Social. A criança tem direito a ser alimentada de forma adequada, a alojamento condigno, a distracções e a cuidados médicos. A criança física ou mentalmente diminuída, ou socialmente desfavorecida deve receber o tratamento que necessita, a educação e os cuidados especiais que o seu estado ou situação exigem.


A Declaração reconhecia ainda a necessidade de amor e compreensão para o desenvolvimento harmonioso da criança, bem como o dever das entidades públicas em prestarem cuidados especiais às crianças sem família ou com famílias sem meios de subsistência suficientes. A criança tem o direito a uma educação gratuita e obrigatória e deve beneficiar desta educação para obter uma cultura geral que lhe permita, em condições de igualdade social, desenvolver as suas capacidades, opiniões pessoais, sentido de responsabilidades morais e sociais e de se tornar num membro útil à sociedade.


A abordagem que se encontravam na base de todos as declarações de carácter não vinculativo sobre esta matéria durante a primeira metade do século XX, consistia no facto das crianças necessitarem de protecção e cuidados especiais. Esta concepção foi ligeiramente atenuada no texto de 1959, o qual consagrou a primeira menção aos direitos civis das crianças, ao reconhecer o seu direito a um nome e a uma nacionalidade. A Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989 viria alterar profundamente esta concepção da infância.


O ano de 1979 foi proclamado como o Ano Internacional da Criança. Um dos objectivos gerais deste evento constituía a promoção dos interesses da criança e a consciencialização do público e dos políticos para as necessidades especiais da criança. Foi a comemoração do Ano Internacional da Criança que deu seguimento ao projecto inicial da Convenção dos Direitos da Criança de 1989.



quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Os Direitos das Crianças em Portugal


2 – Os direitos das Crianças em Portugal


A emergente preocupação com os cuidados na infância surgiu de uma forma definitiva nos finais do século XIX, tendo em conta as mudanças que se verificaram após a Revolução Industrial, uma vez que foi também uma consequência da Revolução Industrial a emergência de um novo problema social: a exploração do trabalho infantil, principalmente entre as camadas mais pobres da população.


Com o final da I Guerra Mundial foi aprovada em 1924, pela 5.ª Assembleia da Sociedade das Nações, a Carta da União Internacional de Protecção à Infância, conhecida como Declaração de Genebra. No entanto, só após o final da II Guerra Mundial é que se começa a notar uma maior preocupação com estas questões, passando a haver uma maior intervenção real, nomeadamente através da criação de vários organismos, entre os quais o Fundo Internacional de Socorro à Infância, (UNICEF), em 1947. No ano seguinte, 1948, é aprovada a Declaração Universal dos Direitos do Homem.


Onze anos depois, a 20 de Novembro de 1959, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprova a Declaração dos Direitos da Criança mas só em 1989, as Nações Unidas avançam realmente em matéria de infância, com a aprovação da Convenção dos Direitos das Crianças.


Portugal, apesar do seu pioneirismo ao ser um dos primeiros países a aprovar uma Lei de Protecção à Infância em 1911 (na sequência da acção renovadora, com a implantação da República), só na revisão constitucional de 1976, e após a Revolução do 25 de Abril, são pela primeira vez consagrados na Constituição da República, como direitos fundamentais, a Infância (art.º 69) e a Juventude (art.º 70).


No entanto só nos anos 90 é que começaram a surgir políticas sociais com vista à protecção e acompanhamento das situações de infância e juventude. Assim, em 1990, Portugal ratificou a Convenção dos Direitos da Criança; em 1991, foram criadas as Comissões de Protecção de Menores; em 1995, foi extinta a Direcção Geral dos Serviços Tutelares de Menores que deu lugar ao Instituto de Reinserção Social; finalmente, em 1999, verificou-se a última grande Reforma do Direito de Menores, com a redacção do diploma legal de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo.





Só nesta altura o Estado assumiu realmente a responsabilidade sobre as crianças ao nível da sua educação, formação e desenvolvimento social, que deveria ser incutida aos progenitores, mas que passou a ser apoiada pelo Estado.



Muita coisa mudou em Portugal desde a proclamação da Convenção dos Direitos da Criança. Estas mudanças foram muito morosas e atrasadas por um longo período ditatorial. Por exemplo, há 25 anos os Direitos da Criança eram uma coisa vaga de que pouco se falava. Havia a Declaração dos Direitos da Criança mas não passava de um enunciado de intenções que todos os Estados aceitavam, mas que não tinha carácter vinculativo.


A sensibilidade para as necessidades especiais das crianças e a sua crescente protecção foi crescendo progressivamente. Actualmente há uma maior sensibilidade para os direitos das crianças a nível nacional. A situação das crianças evoluiu muito nas últimas décadas principalmente em termos da saúde: as taxas de vacinação aumentaram consideravelmente, a assistência durante a gravidez e o parto melhorou significativamente, bem como se verificou um aumento muito grande na taxa de escolarização das crianças.


Continuam, contudo, a existir muitos problemas relacionados com a pobreza e com a exclusão social que se reflectem no modo como as crianças são tratadas, em situações de violência ou no abandono escolar que no nosso país é muito elevado. Há também novos problemas decorrentes do evoluir da sociedade, como o consumo de drogas ou a desestruturação familiar que começam a merecer nova e especial atenção por parte das entidades competentes.

Vinte anos da Convenção dos Direitos das Crianças


Comemora-se este ano o vigésimo aniversário da Convenção dos Direitos da Criança. Um importante documento que contribuiu bastante para a evolução do cumprimento dos direitos das crianças, mas que merece uma reflexão sobre a sua aplicação.

1 – Balanço da Convenção dos Direitos da Criança


Vinte anos depois da Convenção dos Direitos da Criança há que fazer um balanço dos resultados deste documento no mundo. A nível global, apesar das muitas melhorias registadas, a Unicef afirma que ainda existem cerca de metade das crianças no mundo vítimas de injustiça. A muitas faltam ainda coisas tão básicas como o acesso a uma alimentação saudável, saneamento básico, habitação condigna, acesso à educação e à saúde ou água potável entre outras necessidades básicas.


Em 1948 fez-se a Declaração Universal dos Direitos Humanos que proclamava como máxima a igualdade de direitos e liberdades para todos. Segundo esta declaração, a igualdade de todas as pessoas é válida “ sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião pública ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição.”


No entanto, nesta declaração foi esquecido um factor: a idade! Por esse motivo, em 1989 reformulou-se a Declaração Universal de modo a abranger todas as pessoas com menos de 18 anos, que representam mais de um terço da população mundial. Na altura, foi aprovada na Assembleia Geral das Nações Unidas a Convenção sobre os Direitos da Criança.


A existência desta Convenção justifica-se pelo facto de as crianças não serem adultos, não poderem fazer tudo o que os adultos podem, nem tomar decisões, nem agir por elas próprias, precisando assim de protecção especial. Essa protecção às crianças é da responsabilidade dos adultos. Por esse motivo é necessário consagrar direitos próprios às crianças e garantir que sejam respeitados.


Nos cinquenta e quatro direitos da Convenção dos Direitos da Criança encontram-se, pela primeira vez, direitos políticos civis, culturais, económicos e sociais em acordo válido com o direito internacional. A Convenção garante aos menores de 18 anos o direito à sobrevivência, ao desenvolvimento e à participação na sociedade.


Esta foi também a Convenção mais ratificada pelo maior número de Estados (com excepção dos EUA e da Somália) desde a fundação da ONU em 1945. Na prática, a sua aplicação tem sido bastante desigual. Actualmente é considerado crime, sujeito a pena, as crianças – soldados, o abuso sexual, a exploração do trabalho infantil, o tráfico humano e a prostituição infantil, problemas que ainda estão longe de ser resolvidos.


A violação dos direitos das crianças agrava-se em países subdesenvolvidos, onde os direitos humanos não são cumpridos na íntegra. Portanto, apesar de existir ainda muito por fazer na protecção ás crianças, principalmente em países subdesenvolvidos, a Convenção permitiu alcançar uma maior luta pela igualdade e pelo respeito da criança.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

A falta de médicos de Geriatria em Portugal V


5 – Geriatria e Gerontologia: o que são?


A Geriatria e a Gerontologia são campos científicos e profissionais vocacionados para o envelhecimento e para o idoso. A Geriatria, dedica-se à análise e à procura de soluções para todos os problemas que digam respeito à Saúde das Pessoas Idosas, de o modo a preservá-la e a prevenir o aparecimento da doença.
Quando a doença aparece o objectivo da Geriatria é descobri-la o mais cedo possível, tratá-la precocemente e reduzir ao mínimo as suas consequências. Quando, finalmente, não é possível a cura ou a reabilitação, e o envelhecimento e a doença seguem o seu curso inevitável e inexorável, a Geriatria presta os melhores cuidados paliativos nas fases terminais da vida.

A Geriatria é também um dos ramos da Gerontologia, ciência que estuda e se dedica ao envelhecimento do ser – humano. Empenha-se assim a investigar e conhecer todos os efeitos do tempo no ser – humano, em geral. Procura também dar resposta aos mais diversos problemas tais como: quando e como se envelhece, quais os efeitos do envelhecimento das populações sobre a economia, sobre a politica ou sobre a sociedade em geral.

Enquanto a Medicina Interna, essencialmente organicista, está vocacionada para a doença, a Gerontologia/Geriatria estão vocacionadas para o Idoso, para o Idoso – Doente e para as doenças que o Idoso tem; estão vocacionadas para a manutenção da Saúde, da felicidade do idoso e do seu bem – estar porque, para o geriátra, é mais importante o doente que a doença.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

A falta de médicos de Geriatria em Portugal IV

Fonte da imagem


4 - Portugal: um país a envelhecer


Não é novidade que o país está a sofrer um envelhecimento populacional. O envelhecimento é um processo natural e uma realidade do nosso século. A concomitante diminuição da fertilidade tem contribuído de forma acentuada para que a proporção do número de idosos seja cada vez maior e continue a aumentar.



Embora cada vez mais observemos um envelhecimento activo, é inegável que o processo de envelhecimento biológico pode trazer consigo determinadas doenças e falência física que necessitam de cuidados especiais. Não se trata uma pessoa idosa, a nível de cuidados de saúde, da mesma forma que se cuida de um adulto.



Pessoas com 65 anos ou mais são consideradas idosas. O envelhecimento populacional é entendido como a existência de um maior número de pessoas a alcançar ou a passar os 65 anos, associado a um decréscimo dos nascimentos que conduz à existência de um maior número de população com 65 ou mais anos face á população jovem ou adulta existente numa sociedade.



Fonte da imagem

Assim, é urgente que os Cuidados de Saúde apostem cada vez mais na formação de pessoas nos cuidados básicos aos idosos, não só a nível curativo, mas também preventivo, paliativo e de reabilitação, uma área da Medicina com graves falhas no nosso país.


Reconhecer o envelhecimento como um processo contínuo e não como uma doença e intervir de forma segura e atempada na promoção da saúde da população constitui um desafio para todos os profissionais de saúde e para os médicos de clínica geral, em particular.


No entanto, os grandes sintomas geriátricos como demência, desnutrição, entre outras, necessitam de atenção especial e de pessoal competente e especializado nesta fase da vida do ser – humano, pois não se pode tratar da mesma maneira um paciente idoso e um paciente jovem.
È o caso da polimedicação. Um idoso pode tomar cerca de sete medicamentos diferentes por dia. Há a necessidade do médico saber prescrever esta medicação, atentando ao estado geral de saúde do idoso bem como às consequências desta interacção medicamentosa.


Se é dado adquirido que também Portugal esta a sofrer um envelhecimento populacional e que os idosos possuem necessidades especiais, porque razão, em Portugal, há ainda tantas falhas na Medicina no que toca a tender as necessidades desta faixa etária?


segunda-feira, 19 de outubro de 2009

A falta de médicos de Geriatria em Portugal III


3 - Especificidades do idoso e do idoso – doente


Temos de ter em consideração que idoso é um ser humano diferente da criança e do adulto porque:

1- O idoso progressivamente perde capacidades, os seus reflexos, a cinética fisiológica, a percepção, o entendimento e a capacidade de a comunicar:

2. Perde a capacidade de adaptação a novas situações;

3. Ganha aversão às mudanças, , principalmente à mudança de ideias, o que pode condicionar a temível neurose de carácter.

4. È frequente sofrer de disfunção afectiva, necessitando de atenção especial e acompanhamento psicológico e emocional;


O idoso – doente apresenta também algumas características especiais que mereciam ser acompanhadas de forma particular por equipas médicas competentes.

- A perda de autonomia e de independência, factos que lhe provocam uma debilidade emocional superior a qualquer outra pessoa devido ao elo fragilizado existente entre o idoso, a sua família e a sociedade.

- A tendência para a cronicidade e para a invalidez, situações que não encontram a solução na medicina interna, mas beneficiam dos cuidados geriátricos;


- Tem maior necessidade de reabilitação cujos resultados são mais demorados.

- O Idoso vive as suas doenças para além da biofísica, em comportamentos perturbados com perspectivas de morte eminente, numa vivência de medo e de ansiedade.

Também a doença se manifesta de forma diferente na pessoa idosa:

1. Os idosos têm sintomatologia de doença lenta, de frágil expressão e, por isso, dificultam o diagnóstico.
2. São múltiplas.
3. Dificultam e limitam a terapêutica.

Na terapêutica há condicionalismos ligados às especificidades do idoso, O tratamento farmacológico no idoso é uma mínima possibilidade terapêutica; tratar a doença sem abordar o conflito psíquico é prolongar a farmacoterapia. A patologia do idoso nunca é redutível ao biológico, nem ao psicológico, nem ao social; trata-se de um conjunto de sintomas de englobam perturbações psico-sociais, perturbações funcionais, doenças somáticas, alterações psiquiatras entre outras.


Em suma, não podemos de todo querer tratar de uma pessoa idosa da mesma forma que tratamos de um adulto saudável. Os cuidados de saúde a prestar ao Idoso terão de ser específicos, globais e completos, continuados e personalizados, e deverão dirigir-se não só à prevenção no diagnóstico do adoecer, ao tratamento, à reabilitação e à sua reinserção na família e na comunidade, mas também a uma informação e educação psicoterápicas que o conduzam à reaprendizagem de ser saudável e feliz.


sexta-feira, 16 de outubro de 2009

A falta de médicos de Geriatria em Portugal II



2 - A Geriatria é necessária?

Porque razão se torna urgente a especialização de médicos em geriatria? O envelhecimento levanta problemas muito diferentes e muito mais complexos que noutras idades. Por exemplo, na pessoa idosa a doença raramente surge isolada, ao contrário do que acontece, por regra, noutras idades, em que o habitual é existir apenas uma doença sem coexistirem outras doenças de outros órgãos, nem outras incapacidades. Nos idosos a regra é coexistirem múltiplas doenças e incapacidades no mesmo indivíduo. È também frequente no idoso a doença aparecer de um modo completamente diferente, por vezes de modo silencioso e as suas consequências serem também mais graves. Não raras vezes conduzem aos mais diversos graus de incapacidade.


Assim, a geriatria torna-se necessária e imprescindível devido ao explosivo envelhecimento da populaça. Este envelhecimento deveu-se à diminuição da fecundidade e consequente diminuição da natalidade e ao aumento do número de idosos cada ano com mais anos. A intervenção da Medicina Interna e doutras valências médicas foi fulcral neste prolongamento da esperança média de vida, contudo, estes ramos da medicina esqueceram-se e não se responsabilizaram pela qualidade de vida destas pessoas.

Toda esta complexidade ocasiona abordagens terapêuticas complexas não sendo raro que os idosos se encontrem a tomar um elevado numero de medicamentos, prescritos por diversos médicos ou até a tomarem medicamentos não prescritos, comprados livremente, o que faz surgir uma nova doença, não exclusiva nas pessoas mais idosas, mas sem duvida muito mais frequente neste grupo etário. Ora, as especificidades des
te grupo etário exigem a existência de médicos dedicados apenas a estas pessoas e com experiência em tratar e diagnosticar estes pacientes.


A Geriatria é uma área da medicina multidisciplinar e interdisciplinar uma vez que o geriátra tem de trabalhar com profissionais de outras Especialidades médicas ou de outras áreas profissionais a fim de acompanhar a pessoa idosa com a maior precisão possível e prestar-lhe todos os cuidados necessários.


A realidade é que só as ciências que estudam o envelhecimento estão aptas para, sem amadorismos, cuidarem do idoso, prevenirem-lhe as doenças e tratarem-nas, estando assim não só vocacionadas para a pessoa idosa, mas para a pessoa idosa – doente. Porque razão então em Portugal não há médicos formados em geriatria se é uma área tão importante?

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

A falta de médicos de Geriatria em Portugal




Apresentamos um texto composto por cinco pontos acerca da importância da Geriatria em Portugal e da enorme falha que existe na ausência da formação de profissionais de saúde nesta especialidade. Porque importa reflectir sobre esta matéria.

1 - A falta de profissionais de saúde em Geriatria

Apesar de existirem cada vez mais idosos em Portugal, estes são tratados comummente pelos seus médicos de família, uma vez que não existe uma especialidade ou sub – especialidade em Geriatria na medicina portuguesa. O que existem são médicos que têm um grande interesse por este grupo de doentes, mas não chegam o que torna premente a necessidade de resolver esta situação devido ao crescente envelhecimento da população.


Os idosos são um grupo específico, com aspectos funcionais especiais do funcionamento dos seus órgãos que não podem ser tratados como um adulto saudável. A formação em geriatria torna-se fundamental, uma vez que para tratar deste grupo de doentes é necessário que os médicos possuam gosto especifico para lidar e tratar do idoso, reforçando a formação e o conhecimento na fisiologia e fisiopatologia da pessoa idosa, assim como o conhecimento no tratamento especifico destes doentes.


Contudo, apesar desta tendência para o envelhecimento populacional, nenhuma Faculdade de Medicina tem como formação obrigatória a geriatria e aquelas que a têm, funciona como cadeira opcional ou de mestrado ou pós – graduação. Poderão surgir agora duas Faculdades com uma cadeira na área de Geriatria incluída no curso de Medicina, mas é insuficiente.


Além desta grave lacuna, em Portugal a classe médica não se entende sobre se se deve criar uma especialidade em geriatria ou se esta poderia ser um ramo da medicina interna ou da medicina geral e familiar.



Esta formação em geriatria é muito importante, uma vez que vai permitir aos médicos aprender como se manifesta uma doença num idoso, isto porque, por vezes, os efeitos em doentes mais velhos são diferentes dos que estão descritos nos livros e da forma como se manifestam num adulto.


Por outro lado, esta formação vai permitir tratar e medicar a pessoa idosa. O idoso tem várias doenças e está, geralmente, polimedicado. O médico tem de compreender o historial clínico do paciente idoso para o medicar convenientemente, sem consequências de intermedicação e sem consequências para o paciente, pois ao tratar uma doença pode ajudar a agravar outra. Há também a questão psicológica. O paciente idoso está mais fragilizado, necessitando assim, de uma atenção especial e de um acompanhamento diferente por parte do médico.


È urgente apostar na Geriatria em Portugal, uma vez que tal como muitos outros países desenvolvidos, apresentamos tendência para o envelhecimento populacional. A medicina tradicional permitiu-nos a longevidade mas não abrange o bem – estar e a qualidade de vida que esse aumento da longevidade pode diminuir. Por isso a criação de uma área na medicina que inclua a geriatria é importante e permitirá aos cidadãos idosos ter os cuidados necessários e adequados de saúde, bem como, o bem – estar de que necessitam para ser felizes.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Religiões e Globalização



A ciência das religiões tem-se tornado cada vez mais actual, uma vez que o desconhecimento sobre o fenómeno religioso tem levado à emergência de fanatismos, de fundamentalismos e de múltiplos apelos à racionalidade e ao uso da violência.


É impossível conseguir compreender a diversidade cultural e fomentar o diálogo entre civilizações sem compreendermos e conhecermos a fundo as suas religiões e a sua história. Actualmente deparamo-nos, muitas vezes, com a dificuldade em compreender alguns conceitos religiosos fundamentais e a razão de ser de muitos fenómenos sociais e históricos, cujas raízes se encontram na religião.


A ignorância face à essência das religiões pode ter graves consequências na sociedade, uma vez que impede que se compreendam as razões de determinados conceitos, símbolos e fenómenos que caracterizam a vida humana. Abrem ainda caminho a perigosas simplificações que favorecem o desrespeito, a intolerância e a indiferença.


O uso da violência sob invocação religiosa e o fanatismo são fenómenos preocupantes que emergem nas sociedade humanas muitas vezes devido ao chamado vazio religioso, isto é, quando os mistérios e o limite da razão se deparam com questões sem explicação ou com perspectivas fechadas e intolerantes para as quais não encontram explicação.


Em suma, por um lado, a cegueira e o fanatismo religioso, por outro, a irredutibilidade e a indiferença sobre o fenómeno religioso, ambos geram incompreensão mútua e a necessidade de ter respostas para as angústias e para as dúvidas existenciais da vida.


Podemos então falar de religiões e globalização, uma vez que compreender o outro e a sua cultura obriga a que se conheça também a sua religião, a sua história e os seus símbolos. Só esta compreensão poderá levar a um clima geral de paz e desenvolvimento.


A separação entre a Igreja e o Estado foi realmente uma vitória da época moderna, por contraponto às teocracias, adquirindo o que podemos chamar de laicismo religioso, isto é, a separação da esfera religiosa da política. Assim, pretende-se que nas sociedades actuais exista uma convivência pacífica entre diferentes pessoas e formas desiguais de viver e pensar.


Este laicismo pode apresentar também um lado negativo, uma vez que pode ser conducente à desvitalização da sociedade, à descaracterização das identidades e a uma grave fragilização dos factores de unidade e coesão, visto que, este sentimento de união e identidade tem origens religiosas e a repressão artificial pode conduzir á intolerância e á fragmentação social.


Por exemplo, o calendário cristão tem como base as referências temporais que vêm das calendas romanas e que encontram as suas raízes mais profundas nas culturas mediterrâneas da antiguidade. A religião islâmica funda-se na releitura das religiões judaica e cristã. As várias tentativas, após a Revolução Francesa, de criar uma nova era e um novo calendário não vingaram por não serem assumidas pelos cidadãos comuns ligados às tradições culturais e religiosas.



Portanto, quando falamos de laicidade, devemos referir que a laicidade é a preservação da autonomia individual, o respeito mútuo pela liberdade de pensamento e de crença e pela liberdade religiosa, fomentando o diálogo multi – cultural e aceitando o pluralismo de opções e convicções.


Assim, a laicidade caracteriza-se pela capacidade de entender o fenómeno religioso como fenómeno humano, a diversidade religiosa, as suas raízes e a exigência de intercâmbio entre culturas e religiões como condição essencial para a paz, evitando assim o choque de civilizações, cada vez mais real, reservando-nos surpresas de intolerância e violência onde menos se espera.



A realidade é que as religiões serão o grande problema deste século. Basta olhar para os actuais teatros de conflito e para a sua etiologia para percebermos que no pano de fundo de todos os conflitos estão questões religiosas e de diversidade cultural, misturadas com o acesso e disputa por matérias – primas. É por esta razão que a questão religiosa não pode ser desvalorizada e deve ser considerada como campo essencial de procura de elementos susceptíveis de unir a humanidade.


É necessário, para manter o clima de paz, fazer um esforço de compreensão religiosa, como factor de coesão dos povos. É assim, fundamental, alargar o espaço inter – religioso de modo a favorecer a compreensão de identidades abertas, ao invés de votar à indiferença e à ignorância todos os outros fenómenos religiosos. Neste ponto, a religião aparece ligada à globalização, pois ela pode ser foco de união entre os povos, mediante uma compreensão mútua dos diversos fenómenos religiosos dos mais diversos povos e culturas.


A emergência de fenómenos de intolerância e fanatismo parecem contradizer esta ideia, no entanto, é fundamental integrar a liberdade religiosa, o conhecimento dos fenómenos religiosos e o reconhecimento, numa perspectiva de respeito, pelas outras religiões perspectivando a paz mundial. Em suma, a globalização humana capaz de conciliar a coesão e a diferença, a regulação e o conflito, prevenindo a incompreensão e a fragmentação é também a globalização religiosa.


Humanizar a globalização, contrariar a tendência uniformizadora e a harmonização que anula as diferenças e não as respeita, considerar a liberdade e a justiça como elementos estruturantes da mundialização obrigam a pensar a globalização como um fenómeno constituído por diversas identidades que se afirmam, respeitando outras identidades como garante de estabilidade e paz entre os povos.


Fonte

terça-feira, 22 de setembro de 2009

O que não pode deixar de saber sobre emigração portuguesa


1 - Um país de emigrantes


A análise da emigração portuguesa, revela a existência de variações muito significativas desde o início do século XV, com a descoberta das Ilhas Atlânticas dos Açores e da Madeira, seguida do povoamento destes territórios. Desde então, é de realçar a enorme saída da população portuguesa para África e para as Índias Orientais e Ocidentais, facto que passou a ser uma constante desde o início do século XVII após a descoberta das minas de ouro e de pedras preciosas no Brasil e o arranque da emigração para estas paragens. Assim, as estimativas apontam para :

- A saída de 8000 a 10000 portugueses com destino ao Brasil durante o século XVIII; - a saída de cerca de 28000 emigrantes durante a última década do século XIX.


Desde o século XV que Portugal se assumiu como um país de emigração. Os primeiros destinos dos portugueses, acompanharam as conquistas, as descobertas e a expansão marítima. As primeiras vagas de emigração foram para o Norte de África, depois para as ilhas da Madeira e Açores. À medida que as descobertas avançavam para a costa africana, os portugueses emigravam também para esta zona. No final deste século XV cerca de 100 mil portugueses já tinham saído de Portugal.


No século XVI, com a descoberta do caminho marítimo para a Índia, a emigração passou a fazer-se ao longo da África Oriental, e depois no golfo pérsico, Ormuz na Índia, Goa, Diu, Cochim, Coulão, Bassaim e Chaul. Depois estabelecem-se na costa de Coromandel (Bengala), em Malaca, Molucas, na China, Japão, em Timor e Solor (Indonésia). No entanto, é para a Índia que se regista o maior fluxo de emigração neste século.


A nível europeu, a emigração portuguesa registava-se em maior número na Antuérpia, em Sevilha, em Londres e em diversas cidades de França e Itália. A emigração para o Brasil começou a tornar-se cada vez mais importante até que no século XVII se tornou no principal destino dos portugueses.


Durante o reinado Filipino (1580-1640), dezenas de milhares de portuguesas emigraram para Espanha e para as suas colónias. Os portugueses, neste século, estão já espalhados por todo o mundo: do Brasil ao Japão, do Canadá ao Peru, dos países baixos a Moçambique e à Abissínia, de Ormuz e da Pérsia a Timor e às Filipinas, do Rio da Prata a Sevilha e Interior de Castela.


A expulsão dos judeus portugueses contribuiu igualmente para este fenómeno. Estabeleceram-se grandes colónias de emigrantes portugueses na Holanda e na Bélgica, e no Sudoeste da França, Alemanha, Inglaterra, mas também no Norte de África e na região da actual Turquia. Muitos outros rumaram para a Índia e para o Brasil.


Calcula-se que entre 1500 e 1580 tenham saído de Portugal cerca de 280 mil pessoas, sendo que durante a dominação filipina, cerca de 360 mil portugueses emigraram . O número de emigrantes foi tal, que Portugal a partir do século XVI teve de importar mão-de-obra escrava para compensar esta constante saída dos seus naturais.


A ocupação territorial do Brasil absorveu , a partir da segunda metade do século XVI, grande parte da emigração portuguesa. A expansão para o Oriente foi abandonada em favor do Brasil . No final do século, com a descoberta de jazigos de ouro e de pedras preciosas, os portugueses estabelecem-se em Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, tendência que prevaleceu no século XVIII. Entre 1700 e 1760 calcula-se que 600 mil portugueses tenham emigrado .O estabelecimento da Corte portuguesa no Brasil e a posterior independência do país não diminuíram o fluxo de emigrantes.


O incremento da colonização de África fez igualmente disparar o número de emigrantes que se instalaram em Angola e Moçambique. No entanto, dado tratar-se de um tipo de emigração repleta de perigos, o Estado recorria frequentemente a degradados, mendigos, pessoas de etnia cigana e órfãos, sendo esta uma prática corrente até ao século XIX para povoar as regiões mais hostis.


Esta tendência manteve-se até ao século XIX, com uma mudança de atitude na emigração a partir do século XX. Na primeira metade do século XX, a emigração para o Brasil continuou a ser muito forte, embora outros países começassem a ser escolhidos: EUA, Argentina, Venezuela, Uruguai e depois da Segunda Guerra Mundial, também para o Canadá.


Assim, no início do século XX e até 1914, o fluxo emigratório para o Brasil era muito grande, apresentando um registo de 195 000 emigrantes só de 1911 a 1913. Nos anos seguintes, em consequência das duas guerras mundiais e da grave crise económica dos anos 30, a emigração sofre novo decréscimo. Precisamente entre os anos 30 e meados dos anos 40 registou-se o menor volume de emigrantes: 7 000 saídas anuais no período 1939/1945; foi o fim da fase transoceânica que caracterizou a primeira metade do século XX, com predomínio da emigração para o continente americano e em especial para o Brasil, mas logo a seguir, com 26 000 saídas anuais entre 1946 e 1955, inicia-se uma nova fase que decorrerá até meados dos anos 70.


Foi neste período que se registaram os valores mais elevados de emigração em Portugal. Entre 1960 e 1974 terão emigrado mais de 1,5 milhões de portugueses, ou seja, uma média de 100 000 saídas anuais, que só a crise petrolífera de 1973 e consequente recessão económica veio travar. Até então, o movimento emigratório assumiu proporções alarmantes, pois aos números oficiais há que acrescentar o grande volume de saídas clandestinas. O máximo de emigrantes legais registou-se em 1966 (120 000), mas o número máximo de saídas foi alcançado em 1970 (173 300 emigrantes, dos quais 107 000 ilegais). Entre 1969 e 1973, período em que o movimento da emigração clandestina ganhou maior importância, 300 000 portugueses saíram ilegalmente do país, correspondendo a 54% do total de emigrantes.

Esta fase de intensa emigração para a Europa ocorreu durante a guerra colonial e originou um decréscimo de 3% na população entre 1960 e 1970. O principal destino foi a França, país que recebeu um terço (65 200) dos emigrantes na primeira metade dos anos 60 (mais de 300 000 emigrantes). Nos primeiros anos da década de 70 a Alemanha começou também a surgir como destino preferencial dos emigrantes portugueses (29% do total), estimando-se que em 1973 aí residiriam 100 000 portugueses.


As políticas coloniais portuguesas , sobretudo a partir dos anos 30, provocaram igualmente um importante fluxo de emigrantes para as colónias - Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau, Estado da Índia (Goa, Dão e Diu), Macau, Timor). Apesar do número destes emigrantes ter aumentado continuamente até aos anos 70, foi sempre inferior ao daqueles que rumavam para o Brasil e para a França. A emigração para a África do Sul, sobretudo entre 1964 e 1967, atingiu valores significativamente elevados.



Nos anos oitenta e noventa a emigração continuou, sobretudo para a Alemanha e para a Suíça. O fenómeno mais importante foi todavia, primeiro o repatriamento de emigrantes das ex-colónias (1974-1977), e depois o retorno de emigrantes dos países europeus (reformados) a partir dos anos oitenta. Actualmente, passamos de um país de emigração para um país de imigração. Contudo, continuamos a registar alguns índices de emigração, feita por razões diferentes das anteriores.


A nova emigração portuguesa é qualificada. Mais de metade dos emigrantes são jovens e completaram o ensino secundário ou superior. Presentemente , 52% dos 27 mil portugueses que emigram possuem habilitações literárias mais elevadas e partem devido ao aumento do desemprego nacional e aos baixos salários praticados no nosso país. Os destinos da emigração nacional não se alteraram muito. Suíça e França continuam como preferidos, seguindo-se uma novidade: a Espanha. De salientar que nestes emigrantes se incluem muitos investigadores. Portanto, estamos a exportar importantes recursos humanos qualificados, acabando por importar mão-de-obra barata e sem qualificações.


Em suma, os últimos trinta anos da sociedade portuguesa registaram, do ponto de vista dos movimentos migratórios, três acontecimentos marcantes. O primeiro foi a chegada, em poucos meses, de um intenso fluxo de mais de meio milhão de portugueses e de população de origem portuguesa, residente nas ex-colónias africanas , em consequência do 25 de Abril de 1974 e do subsequente processo de descolonização que lhe esteve directamente associado. O segundo acontecimento foi o regresso parcial de emigrantes; o terceiro foi a intensificação dos fluxos imigratórios, num país tradicionalmente de emigração

O grande fluxo de emigração dos anos sessenta


1. 1 - O grande fluxo de emigração dos anos sessenta


A partir da segunda metade do século XX, as preferências da emigração portuguesa fixaram-se na Europa , em particular na França, com uma quebra acentuada da emigração transatlântica. O incremento dos movimentos da população no continente europeu , sobretudo no período posterior à segunda Guerra Mundial, constituiu um dos sintomas do processo de desenvolvimento e da mudança social que experimentou o velho continente no período de reconstrução e da expansão económica que se seguiu àquele conflito armado.


Neste caso não só as razões de natureza económica relacionadas com o nível de vida, as fracas oportunidades de emprego existentes nas regiões rurais e a incapacidade do tecido produtivo para absorver os contingentes de assalariados e de trabalhadores libertos das actividades agrícolas e de subsistência, contribuíram para acelerar este movimento. Também as razões de natureza política decorrentes do regime Salazarista e da guerra em África justificaram muitas dessas saídas.


Durante o período do Estado Novo saíram de Portugal, à procura de trabalho ou melhores condições de vida, mais de dois milhões de portugueses. Desse número, mais de 40% das partidas ocorreram nos anos sessenta. As primeiras décadas do regime, que foram abrangidas pela crise de 1929 e pela II Guerra Mundial, pela recessão económica e pela insegurança internacional , foram de fraco fluxo emigratório, apenas 7000 portugueses abandonaram o país.


Na década de 50, a expansão económica europeia provocou uma alteração no destino emigratório, sendo que o destino dos emigrantes, legais e ilegais, substituiu a América pela Europa, em particular pela França. No ano de 1950, as saídas já atingiram o número de 20 mil e foram subindo em flecha até, em 1970, atingirem as 183 mil saídas anuais. Em 1960, a emigração aumentou extraordinariamente e, em 1962, a emigração clandestina ultrapassou os 61%, sendo de 511 899 o número de clandestinos portugueses em França. Portugal passou então por um fenómeno de emigração crescente, em que famílias inteiras, de todas as regiões do país (zonas rurais, urbanas industrializadas, de maior e de menor densidade populacional) e portugueses de diferentes categorias profissionais abandonaram o país.


Desde finais dos anos 50, e sobretudo na década de 60, foram também consideráveis os movimentos migratórios de todos os territórios portugueses para as então colónias africanas. É também neste período que a Venezuela se afirma como destino da emigração portuguesa, em especial de madeirenses (mais de 60% dos cerca de 400 000 residentes de origem portuguesa), que também procuraram a África do Sul, onde hoje residem cerca de 300 000 portugueses, maioritariamente madeirenses. No continente americano, Estados Unidos e Canadá não deixaram de exercer uma forte atracção, recebendo sobretudo emigrantes açorianos.

Nos Açores, terra de emigração desde os mais recuados tempos, o maior fenómeno emigratório moderno deu-se a partir de 1957, aquando da erupção do vulcão dos Capelinhos, na ilha do Faial: num gesto de solidariedade o Canadá ‘abriu’ a imigração às vítimas do vulcão e, quase imediatamente, a todos os açorianos. Vejamos o exemplo da ilha de São Miguel, onde de 1957 a 1977 emigraram 107 131 pessoas, mais de metade das quais para o Canadá e dois quintos para os Estados Unidos.


Na Madeira, ilhas de grande densidade de população e poucos recursos, a emigração foi sempre uma das opções tomadas: de 1900 a 1974 o número de saídas legais elevou-se a 152, 000, metade das quais no período 1955/1974. A composição dos fluxos emigratórios também se alterou: inicialmente constituídos por mão-de-obra masculina, os últimos anos da década de 60 revelam uma maior participação feminina – 40% em 1966, 48% em 1967 e 54% em 1968 – e uma maior proporção de jovens menores de 15 anos, valores que evidenciam o processo de reagrupamento familiar em curso nesse período. Em traços gerais, a maioria dos emigrantes era adulta, sobretudo homens com baixos níveis de escolaridade e de qualificação profissional.

A partir de meados dos anos 70 a emigração em Portugal entra numa nova fase. Desde logo pela grande quebra verificada no número de saídas: entre 1974 e 1988 a emigração oficial cifrou-se em 230 000 saídas, o que corresponde a uma média anual de, apenas, 15 000 emigrantes. A par desta redução da emigração, os destinos dos emigrantes também sofreram uma maior diversificação. Os portugueses continuaram a partir para a Europa – França, Espanha, Luxemburgo, Suíça e Alemanha, revitalizando redes já existentes ou criando novos espaços de emigração – mas também para os Estados Unidos e Canadá e outros destinos longínquos como a Austrália, África do Sul e países do Médio Oriente.

A crise económica ocorrida na Europa nos anos 70 travou a emigração. A subida do desemprego conduziu os países receptores a adoptarem medidas de forma a impedir a entrada de mais emigrantes, criando até incentivos para o seu regresso ao país de origem. Neste período ficou também bem patente a dispersão e fixação dos portugueses e dos seus descendentes por todos os continentes, donde o surgimento de significativas comunidades portuguesas espalhadas por todo o mundo.

Causas e características da emigração portuguesa


2- Causas e características da emigração

Várias são as causas que , ao longo do tempo, têm levado as pessoas a emigrar. Principalmente as más condições de vida no país de origem, têm sido a principal causa. Contudo, importa assinalar que também algumas circunstâncias de natureza política têm determinado a necessidade de emigrar como por exemplo, devido a perseguições de natureza política, à falta de liberdade expressão, à guerra nas antigas colónias e às práticas sociais dominantes que levaram à fuga de muitos jovens, antes ou durante o cumprimento do serviço militar.


O grande fluxo de emigração para a Europa , conhecido entre nós no decurso dos anos sessenta e setenta, contribuiu para enfraquecer o movimento transoceânico e acompanhou a tendência global da emigração intra-europeia registada igualmente noutros países europeus durante a segunda metade do século XX. A importância destas saídas foi bastante acentuada nas regiões densamente povoadas do norte e do centro do país, assim como nas Ilhas Atlânticas dos Açores e da Madeira.


Da mesma forma, este fenómeno afectou as regiões do Minho, de Trás-os-Montes e da Beira - Alta, de onde partiram os maiores contingentes de emigrantes não só em direcção ao Brasil mas também, já durante a segunda metade do século XX, para os países industrializados da Europa Ocidental: França, Alemanha; Luxemburgo e mais recentemente para a Suíça. Segundo registos oficiais efectuaram-se cerca de um milhão de saídas no período compreendido entre meados dos anos cinquenta e os finais dos anos oitenta do século passado.

A dimensão do fenómeno da emigração confirma tratar-se de uma constante estrutural da sociedade portuguesa associado à falta de condições de subsistência relacionadas com as más condições de vida da população, com a estrutura fundiária e com as pressões demográficas decorrentes do declínio das antigas civilizações agrárias da Europa mediterrânica.



Estes fluxos de emigração tiveram várias consequências a nível nacional. Entre elas, o processo de crescimento urbano e industrial, sobretudo na faixa centro e norte litoral do território e o aumento dos movimentos da população com destino aos principais centros urbanos agravando, desta forma, o processo de desertificação do interior que se tem vindo a acentuar no decurso das últimas décadas .

Os portugueses na Austrália e Luxemburgo


i) Os portugueses na Austrália

Os pioneiros da emigração portuguesa para a Austrália foram os madeirenses, que na década de 50 estabeleceram uma pequena comunidade piscatória, na cidade de Fremantle, na costa ocidental. Desde então, os portugueses continuaram a chegar à Austrália em número sempre crescente até aos anos 90, altura em que muitos começaram então a regressar a Portugal.


De acordo com o recenseamento de 1996 levado a cabo pelo Australian Bureau of Statistics, a Austrália contava nessa altura com cerca de 17 mil pessoas nascidas em Portugal e mais cerca de nove mil descendentes de portugueses, que em conjunto representavam uns meros 0,15% da população australiana Apesar de pequena, a comunidade portuguesa encontra-se razoavelmente bem organizada.


Estes emigrantes são pessoas com fracas habilitações literárias (cerca de 61% da comunidade portuguesa não possui habilitações literárias ou qualificações profissionais de qualquer espécie) que apostaram em áreas como a restauração e hotelaria, difundindo a cultura portuguesa na Austrália. Se, por um lado, a falta de qualificações impede a comunidade portuguesa de ter um papel mais relevante na sociedade australiana, por outro lado é essa mesma falta de qualificações que mantém a comunidade empregada, dada a abundância da oferta de trabalho para mão de obra não qualificada.


A taxa de desemprego da comunidade portuguesa situada sete pontos percentuais abaixo da média nacional de 9.2%. Regra geral, a mão-de-obra não qualificada é razoavelmente bem paga e a grande maioria dos portugueses consegue manter um nível de vida igual - e por vezes superior - à média australiana. Mas a comunidade portuguesa conta também com profissionais altamente qualificados, como médicos, advogados e docentes universitários, que muito têm contribuído para a causa lusitana. A sua presença é, no entanto, discreta, e a sua visibilidade dentro e fora da comunidade bastante reduzida. Não só por serem em menor número mas também porque, ao integrarem-se melhor na sociedade australiana, fazem que as suas raízes étnicas deixem de ser perceptíveis. Uma nova vaga de portugueses altamente qualificados está a chegar à Austrália e promete abrir um novo capítulo na história das relações entre os dois países.

j) Os portugueses no Luxemburgo

A emigração portuguesa para o Luxemburgo inicia-se em meados dos anos 60 do século XX, quando os portugueses começam a substituir os emigrantes italianos como força de trabalho. Presentemente constituem a maior comunidade de estrangeiros do país, com 54.490 pessoas (10,8% da população), seguidos pelos italianos (5%),franceses (3,4%), belgas ( 2,5%) e alemães ( 2,2%).

Os portugueses em Macau e Espanha


g) Os portugueses em Macau

A presença dos portugueses na China, data dos anos 20 do século XVI, quando passaram a frequentar com regularidade as suas costas para fazerem comércio com os seus habitantes. Macau tornou-se rapidamente no principal entreposto de comercial e cultural entre o Ocidente e o Oriente. Na sequência da queda da ditadura em Portugal, em 1974, Macau passou a ser reconhecido como um « território chinês sob administração portuguesa»: Mais tarde Portugal propôs à China a entrega de Macau, salvaguardando a cultura e especificidade deste território, o que veio a acontecer em Dezembro de 1999.

O chinês e o português são as línguas oficiais, sendo o cantonense falado em todo o território. As línguas oficiais são usadas nos departamentos do governo, assim como em todos os documentos e comunicados oficiais. Em geral o inglês é usado no comércio e turismo


Depois da integração de Macau na China a ligação com Portugal continua a ser muito viva. A China tem mantido alguns dos aspectos que individualizaram durante séculos este território, procurando nomeadamente reforçar os contactos comerciais com todos os países de expressão oficial portuguesa. Macau continua a ser uma porta para a influência chinesa no Ocidente


h) Portugueses em Espanha


No total são cerca de 70 mil os emigrantes portugueses em Espanha, um número relativamente pequeno se tivermos em conta o número de emigrantes portugueses em países como a Suíça, Grã-Bretanha, França ou mesmo nos Estados Unidos. Uma larga percentagem destes emigrantes residem em Portugal, embora trabalhem em Espanha. A proximidade entre os dois países facilita a emigração temporária.


Estamos perante uma emigração constituída por pessoas com um baixíssimo nível de escolaridade, oriundas dos meios mais pobres de Portugal cujos recursos não lhes permitem também grandes possibilidades de deslocação; limitam-se a atravessar a fronteira e a arranjarem trabalho num sítio qualquer de Espanha, tentando aproximarem-se tanto quanto possível dos Pirenéus. As regiões mais deprimidas de Trás-os-Montes foram aquelas que maior número de emigrantes forneceram para os trabalhos nas minas de Leon e Astúrias.

Os portugueses na África do Sul, Venezuela e Suiça


d) Os portugueses na África do Sul


A grande vaga de emigrantes deu-se a partir dos anos 50 do século XX, na sua maioria oriundos das ilhas da Madeira. Após a Independência de Angola e Moçambique (1975), ocorreu uma segunda vaga, quando milhares de portugueses que haviam abandonado estes países se fixaram na África do Sul. Com o fim do regime do "apartheid", em 1990, todos os brancos, incluindo os portugueses, passam a acusados de terem colaborado com as práticas racistas anteriores. Não tardou em ocorrer um aumento dos atentados e assassinatos de brancos. Não estamos perante qualquer perseguição de cariz racista a uma dada comunidade, mas de um aumento brutal da criminalidade neste país, onde as clivagens sociais continuam a ser enormes. Portanto, a comunidade portuguesa neste país são cada vez menor e menos significativa.


e) Os portugueses na Venezuela


A presença de portugueses na Venezuela data do século XVI, no entanto a primeira comunidade de portugueses só se fixou no princípio do século XVII. Filipe II de Espanha permitiu que os cristãos-novos portugueses se estabelecessem nas suas colónias na América, incluindo a Venezuela. No entanto, só no século XX é que esta emigração foi significativa, principalmente nas décadas de quarenta e cinquenta. saíam principalmente da Madeira, e zona Norte de Portugal.



Em 1950 viviam na Venezuela cerca de 10.954 portugueses ( 8% do total da população estrangeira), dedicando-se primeiro à agricultura e depois também ao comércio. Entre os anos 40 e 60 muitos portugueses se refugiaram na Venezuela por motivos políticos.
Actualmente cerca de 70% das padeiras e dos restaurantes, 50% das mercearias são propriedade de portugueses ou dos seus descendentes. Vivem na Venezuela cerca de 400 mil imigrantes portugueses.


f) Os portugueses na Suíça


A emigração de portugueses para a Suíça foi até aos anos 60 muito esporádica, e quase sempre confinada aos grupos sociais de maiores rendimentos. A primeira vaga de emigrantes começou nessa década, para suprirem necessidades de mão-de-obra nos sectores da Construção Civil, Hotelaria e a Agricultura (1970: 3.632 portugueses).No final dos anos 70 tornou-se numa terra de emigrantes portugueses, nomeadamente para os que regressaram de África . Vivem e trabalham na Suíça cerca de 152.826 cidadãos lusos, constituindo a terceira comunidade estrangeira a residir neste país. Ao todo representam 9,5% dos 1,43 milhões de habitantes de nacionalidade não suíça.

Os portugueses na França


c) Os portugueses na França

A grande emigração para França é algo relativamente recente, data do final dos anos 50 do século XX, quando cerca de 1,5 milhão de portugueses emigraram para este país. Em 1990 registavam-se neste país um total de 798.837 pessoas de origem portuguesa (603 686 mil haviam nascido em Portugal e 195 151 em França).


A emigração de portugueses para França entre 1961e 1974 é um dos episódios mais impressionantes da história contemporânea de Portugal. A emigração que ocorre a partir de meados dos anos 50 tem uma natureza muito distinta da anterior. Esta é marcada por uma profunda descrença nas capacidades de desenvolvimento do país, sob o jugo de uma ditadura desde 1926. O aumento da informação do que se passa no resto na Europa, não deixa dúvidas: a única forma de fugirem às condições degradantes em que viviam e trabalhavam em Portugal era partirem para a Europa.


Em 1950, apenas se registam 314 emigrantes. Quatro anos depois são já 747 para em 1965 atingirem os 1.336. Em 1958 serão 6.264. A partir daqui os números disparam. Em 1970, atinge-se o valor máximo: 135.667 indivíduos num só ano. Entre 1958 e 1974, cerca de um milhão de portugueses instala-se em França, dispostos a trabalhar em qualquer posto. Assim, a sua exploração era facilitada e começava muitas vezes em Portugal, com as redes que os transportavam até à fronteira, e não raro os abandonava pelo caminho. Muitos portugueses morriam neste percurso.


Em França eram vítimas de todo o tipo de discriminações no trabalho, no alojamento e nas mais pequenas coisas do dia-a-dia. poucos emigrantes esperavam enriquecer, mas todos esperavam conseguirem uma vida mais digna . Tratava-se de uma verdadeira vaga, em grande parte clandestina, contra a qual todas as leis se revelavam ineficazes. Em poucos anos despovoaram-se regiões inteiras abrindo-se profundas rupturas nas estruturas económicas, sociais e culturais de Portugal.


Estes emigrantes eram frequentemente pessoas de baixo nível cultural e sobretudo despolitizadas, quase sempre ligados a profissões desqualificadas. As mulheres conseguiam vagas como porteiras e os homens como operários da construção civil. Ocupavam bairros – de –lata e viviam em condições de extrema precariedade, bem piores que aquelas que tinham no seu país de origem.

Os portugueses nos EUA


b) Os portugueses nos Estados Unidos da América


No século XVII formaram-se as primeiras comunidades de portuguesas nos Estados Unidos e no século XIX, os imigrantes portugueses já estavam espalhados por todo o território norte-americano, concentrando-se em especial nas zonas costeiras, em localidades portuárias onde existiam importantes actividades piscatórias. A que a pesca da baleia foi uma das actividades que levou ao longo dos séculos muitos portugueses para os EUA, em particular os açorianos.


A emigração massiva de portugueses para os EUA ocorreu entre 1820 e 1872, quando entraram nos EUA 379.130 imigrantes. A questão que dividia os dois países era a questão colonial.. A emigração portuguesa para os EUA manteve-se muito elevada até ao final dos anos 20. Entre 1901-1910: 69.140 emigrantes; 1911-1920: 89.732; 1921-1930:.30.000 emigrantes . Depois da crise de 1929, foram tomadas medidas muito restritivas contra a emigração. Os candidatos, por exemplo, tinham que saber inglês falado e escrito. O número de emigrantes portugueses desceu entre 1931 e 1950 para cerca de 10.750.


A segunda vaga de emigração, depois do século XIX, ocorreu na sequência da erupção do vulcão dos Capelinhos (1957), na Ilha do Faial, Açores. Os americanos concederam vários vistos para as famílias afectadas pelo vulcão. Entre 1958 e 1965 cerca de 15.000 açorianos do Faial emigraram para os EUA. Este acontecimento provocou uma mudança das leis da emigração deste país. Calcula-se que em consequência destas, entre 1960 e 1980 cerca de 180.000 portugueses tenham emigrado para os EUA (metade destes emigrantes eram açorianos).

Os portugueses no Brasil


a) Os portugueses no Brasil


Portugal e o Brasil partilham uma história comum desde o seu descobrimento, em 1500. Em rigor só se pode falar de imigração portuguesa no Brasil após a Independência deste país em 1822. Diversos estudos revelaram um constante movimento migratório de portugueses para o Brasil desde o século XVI, o qual aumentou no século XVIII. Após a Independência prosseguiu o fluxo migratório, tendo atingido a sua máxima dimensão entre 1901 e 1930. Esta emigração manteve-se muito elevada até finais dos anos 50 do século XX, quando cessou quase completamente. A partir dos anos 60 o movimento migratório passou a ser do Brasil para Portugal, atingindo a partir do final dos anos 90 valores muito significativos.


O Brasil apresentava-se como um terra de enormes oportunidades para os portugueses, sem os perigos que tinham de enfrentar noutras regiões do mundo. Durante muito tempo, o fluxo migratório para o Brasil, foi de tal forma acentuado que o despovoamento no país foi notório e durante séculos carecemos de mão-de-obra , travando o desenvolvimento nacional. ligada à acção de colonização, e que se traduziu na ocupação durante o século XVI de todo o litoral costeiro, os emigrantes portugueses eram atraídos pela exploração do açúcar, do tabaco e depois do ouro e pedras preciosas. .


A emigração não terminou com a independência do Brasil. Os fluxos migratórios eram suscitados pelas necessidades de mão-de-obra em inúmeras actividades, em espacial as relacionadas com o comércio, a indústria, mas também com as plantações de café e de algodão. Estas necessidades foram agravadas pelo fim do tráfico de escravos (1850) e depois com a abolição da escravatura (1888). Os imigrantes europeus, incluindo os portugueses, foram substituindo progressivamente a mão-de-obra escrava. No final do século, milhares de emigrantes dirigiam-se também para o Amazonas, onde se iniciou a exploração da borracha.


Com a implantação da República em Portugal, a vaga de emigrantes rumo ao Brasil voltou a aumentar. No entanto, todo o século XX foi marcado pela redução do número de emigrantes para o Brasil. A maioria destes emigrantes era trabalhadores rurais ou pequenos comerciantes, construtores civis ou possuíam profissões domésticas. No geral, tratava – se de pessoas desprovidas de capacidade técnica para a direcção e orientação das grandes tarefas do comércio e da industria. Saíam em famílias completas, com elevada percentagem de mulheres e de crianças, na sua maior parte analfabetas.